Depois da hipnose, minha vida mudou
Três garotas comprovaram que a reprogramação do cérebro
pode ajudar a superar traumas, controlar a ansiedade e a depressão e até a
perder peso.
Entenda tudo sobre essa técnica que está dando o que
falar
por Mariana Sgarioni e Luciana
Farnesi
Você está com sono, muito sono… Quantas vezes você já viu
personagens de desenhos animados balançando um pêndulo, repetindo essa frase e
fazendo hipnotizados obedecerem às suas ordens? Esqueça a ficção. Longe das
telas, na vida real, a hipnose é um tratamento sério que vem sendo cada vez mais
procurado para vencer os males da vida civilizada. Quem não conhece alguém que
foi assaltada e ficou com medo de sair de casa?
Ou
uma amiga deprimida porque perdeu o emprego?
Ou
ainda aquela outra que morre de medo de avião? Fobia, depressão, ansiedade,
angústia, stress são alguns dos problemas que a hipnose vem resolvendo com
sucesso. Tanto que, em 1998, médicos da Universidade de Harvard, nos Estados
Unidos, divulgaram um estudo para o mundo inteiro comprovando a eficácia do
método para mudar padrões de comportamento pela atuação no
inconsciente.
Antes de duvidar da idéia, veja como a hipnoterapia
funciona. Para chegar na origem do problema, o hipnoterapeuta vai conduzi-la a
relaxar profundamente até atingir um estado alterado de consciência. “Nesse
estado, há uma diminuição da autocensura que permitirá que você fale sobre
eventos que, quando acordada, não se lembra”, explica o psicanalista Rubens
Marcelo Volich. Ao acessar esse “banco de dados” escondido, o terapeuta é capaz
de interferir na forma como esse arquivo está disposto, mudando a forma como
você encara os problemas ligados àquele episódio.
O
primeiro passo para um tratamento é uma longa conversa com o terapeuta, em que
ele levantará seu histórico completo. Depois, você será convidada a colocar-se
numa posição bem confortável sentada numa cadeira ou deitada numa cama. Há
diversas técnicas para estimular o transe; a mais comum é a repetição de
palavras ou frases em tom monótono. “São frases curtas, com pequenas pausas, que
reduzem o ritmo cerebral e deixam o organismo num estado profundo de
tranqüilidade. Trabalhamos então com imagens, fazendo com que a garota enxergue
algumas situações e tenha sensações correspondentes”, explica o psicólogo e
hipnoterapeuta Odair José Comin.
O
médico José Álvaro da Fonseca conta o caso de uma mulher que comia demais porque
vivia ansiosa, tentando render mais e mais no trabalho. Ele a hipnotizou e
construiu cenas onde seu desempenho profissional melhorava, eliminando a causa
da ansiedade. Resultado: a autoconfiança da paciente foi reforçada e ela
emagreceu. É como mudar uma chave no cérebro. Só que, para atingir esse estado
de consciência alterado, você precisa estar disposta a isso. Ninguém é
hipnotizada contra a vontade, muito menos faz coisas que não faria se estivesse
acordada. “Mesmo em transe, nunca agimos contra nossa moral, nossos princípios.
Não entramos em outro mundo: sabemos tudo o que acontece ao redor, como o
telefone tocando, as buzinas dos carros passando, a porta batendo”, explica José
Álvaro. Segundo ele, na maioria das vezes, são necessárias cerca de oito sessões
de 50 minutos em média para sanar um problema.
A
consciência que censura
O
segredo da hipnose, na verdade, é o estado entre o sono e a vigília. É neste
momento que o consciente esse danado que questiona tudo e que muitas vezes
esconde seus traumas de você mesma fica neutralizado. Sem a censura do
consciente, o terapeuta fisga a origem do problema e faz com que você vivencie
as experiências traumáticas novamente, só que de uma forma suave. Ele pode ainda
diminuir ou anular uma dor, convencendo o cérebro de que aquela sensação não
existe. Era isso, aliás, que muitos médicos faziam na Segunda Guerra Mundial,
uma vez que precisavam operar pessoas sem anestesia. “Você pode ativar processos
desse tipo por conta própria e se auto-hipnotizar. É uma questão de treino”, diz
o hipnoterapeuta Jean Jacques Buhannic, certificado pela National Guild of
Hipnotists, dos Estados Unidos. “Tente se auto-sugestionar o tempo todo:
fale bem de si mesma, pare de se criticar, acolha seus erros, adote uma postura
positiva.”
Sem medo do espelho
Não é consenso entre os hipnoterapeutas, mas há os que
afirmam que, na luta contra a balança, a hipnose pode ser uma grande aliada.
Afinal, conscientemente, você sabe o que precisa fazer para perder peso: dieta e
exercícios. Então por que a solução não é tão simples quanto deveria? Na maioria
dos casos, a culpa é da ansiedade, que faz você comer mesmo quando não está com
fome. E é aí que a hipnose pode atacar com eficiência. “A garota ansiosa perde o
foco do problema, não consegue enxergar com transparência o que está
acontecendo. A hipnose ajuda a lidar com a ansiedade, não impedindo que ela
surja, mas permitindo a você deixá-la sair de forma saudável, sem fazer da
comida uma válvula de escape”, explica o médico Leonard Verea, presidente da
Sociedade Brasileira de Hipnose Clínica e Dinâmica. Além da ansiedade, há outros
fantasmas que perseguem quem não consegue perder peso. E o estado hipnótico
funciona para tentar descobrir qual o seu problema específico e a melhor maneira
de lidar com ele. O tempo de tratamento varia de acordo com as barreiras a serem
superadas, mas dura, em média, de três a seis meses, com uma sessão por semana.
Só um alerta: a hipnose é uma ferramenta que trabalha a raiz dos problemas
emocionais, e não diretamente suas conseqüências. Isso quer dizer que o ideal é
unir o tratamento a uma dieta e à malhação. Assim, o trabalho é conjunto, pois a
hipnose ajuda você a seguir seu plano de emagrecimento sem sair da
linha.
Em
transe, sem risco
Não há nenhum órgão oficial que regulamente
hipnoterapeutas.
Profissionais de saúde (médicos e dentistas) ou
psicólogos são os que mais recorrem ao método. Escolha alguém que tenha feito
pelo menos mais de um curso a respeito no Brasil, o Instituto Milton Erickson é
um dos principais centros de formação em hipnose. Hipnose requer prática.
Prefira profissionais que já usam o método há muito tempo e com freqüência. Uma
sessão de hipnose mal conduzida pode despertar problemas que ainda não existiam.
Por isso, antes de escolher o terapeuta, procure indicações com um médico ou
psicólogo de sua confiança.
Perdi 8,5 kg em dois meses
“Há quatro anos comecei a engordar. Saía do trabalho no
meio da tarde para comer sanduíche na padaria, não sossegava enquanto não
devorasse a caixa de bombons que tinha aberto. Nesse ritmo, em dois anos
acumulei 10 quilos e iniciei a batalha para emagrecer: fiz natação, ginástica
aeróbica, kung fu e musculação, procurei endocrinologista e apelei até para a
dieta das frutas. Suspeitei que a raiz do problema fosse a ansiedade, então,
tentei a meditação, a ioga e a terapia. Nada funcionou. Dois anos depois, tinha
engordado mais 2 quilos: cheguei aos 65 quilos para 1,60m de altura. E a
ansiedade crescia à medida que aumentava minha responsabilidade no trabalho.
Tentei me controlar mais uma vez, fechei a boca e perdi 3,5 quilos em um mês,
com muito esforço. Foi então que decidi experimentar a hipnose. Nos dois meses
seguintes, perdi outros 8,5 quilos. E o melhor: sem sofrer, já que aprendi a
lidar com a minha ansiedade. Não foi o hipnoterapeuta que me disse o que fazer:
eu descobri o caminho. Com a hipnose pude enxergar a verdadeira dimensão do meu
problema, como se estivesse me vendo de fora. Sair da sessão super relaxada me
fez perceber que não estar ansiosa era possível, e que eu poderia prolongar
aquela sensação tão boa. Mas o tratamento ainda continua, porque o desafio agora
é parar de fumar.”
Raquel Pires, 35 anos, publicitária
Me
livrei da depressão
“Somatizei meus problemas durante a vida toda. Bastava
não alcançar um objetivo, conviver com alguém que não gostava ou me deparar com
uma dificuldade maior que lá estava eu doente, vomitando e com diarréia. Há três
anos, comecei a sofrer também de depressão: cheguei a ficar dois dias fechada no
quarto sem comer. Foi quando minha psicóloga me indicou um hipnoterapeuta.
Conversamos sobre minha vida e meus problemas de saúde, até aqueles de quando
era pequena. Ele pediu que me deitasse, fechasse os olhos e começou a falar
algumas frases. Depois, pediu para contar de 100 para baixo e imaginar cenas
agradáveis. Quando entrei em transe, perguntou dos momentos em que havia ficado
mais triste. Lembrei da morte da minha mãe, aos 13 anos, e de quando fui
internada no hospital. Chorei muito, desabafei, cheguei a brigar com Deus por
ter levado minha mãe. Aliviada, depois da primeira sessão voltei a trabalhar.
Fiz três sessões e nunca mais tive depressão nem nenhum dos outros
sintomas.”
Karina Pessoa, 30 anos, fonoaudióloga
Voltei a respirar
“Sofri de asma e bronquite desde pequena. Quem tem esse
problema sabe que é um drama: a qualquer momento você pode sentir o ar faltar.
Há cerca de três anos, resolvi consultar um médico que tratava seus pacientes
com hipnose.Não acreditava muito que poderia dar certo, mas apostei para
ver.
Confesso que senti um pouco de medo do que poderia
acontecer enquanto estivesse fora do estado normal. Mas o médico me explicou que
eu lembraria tudo depois. Então, pediu que eu sentasse e colocasse as mãos nos
joelhos. Começou a falar pausadamente. Sem perceber, estava hipnotizada. Ele
mandou que eu levantasse um braço e disse que ele estaria duro como pedra. Era
incrível: não conseguia mexê-lo! De repente, você não controla mais seu corpo,
mas tem consciência de tudo o que está acontecendo. O médico associou minha
bronquite à tristeza guardada no pulmão. Acordada, não conseguia saber por que
estava triste. Hipnotizada, ele me fez lembrar da morte do meu pai, quando tinha
4 anos. Então, disse que a partir daquele momento minhas mucosas não estariam
mais inflamadas; que as células do meu pulmão voltaram a ser felizes e não havia
mais motivo para tristeza. Parei de sentir meu peito chiar. Acabei não fazendo o
tratamento todo por falta de dinheiro, mas a partir daí tive pouquíssimas
crises. Agora quero voltar lá para perder uns 5 quilinhos que teimam em não ir
embora!”
Mariana Lancellotti, 24 anos,
relações-públicas
Publicado originalmente no wordpress do Prof. Rogério Castilho, meu primeiro professor de Hipnose Clínica.